(Valor Econômico – Economia – 07/10/2020)
Anaïs Fernandes
A tributação dos fundos imobiliários no Brasil precisa ser repensada à luz do desenvolvimento urbano, de forma que renúncias fiscais reflitam uma política pública mais racional e inclusiva, avalia Fernando Túlio Salva Rocha Franco, presidente do braço paulista do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-SP) e professor convidado do Insper.
Mestre em gestão e políticas públicas pela FGV, Franco desenvolveu uma pesquisa em que “raspou” dados de todos os Fundos de Investimentos Imobiliários (FIIs) registrados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) com uma amostra de dois anos (2016 a 2018) e estimou que, no período, a isenção tributária desses fundos somou cerca de R$ 1,5 bilhão.
Analisando especificamente FIIs de renda - que investem sobretudo em empreendimentos para obter ganhos com locação -, Franco observou que não há qualquer relação estatística entre o percentual de renúncia fiscal dos imóveis nos fundos e a renda nominal média dos domicílios da região em que eles estão inseridos. A isenção também não é explicada por indicadores de vacância, inadimplência, rentabilidade do fundo ou do imóvel, valor do metro quadrado ou presença de investidores estrangeiros.
Para o pesquisador, os dados mostram que, embora do ponto de vista territorial os imóveis dos FIIs se concentrem em áreas mais valorizadas, as renúncias fiscais não refletem nenhum tipo de política pública urbana. Tampouco atenuam o que Franco chama de “lógica regressiva” do imposto sobre a renda dos aluguéis. O fundo imobiliário em si não é tributado, mas o cotista sim, nos rendimentos e ganhos de capital. Há situações, porém, de isenção à pessoa física. Assim, Franco calcula que, em certos casos, a tributação do aluguel pode ser de 27,5% para o proprietário que vive da locação de um imóvel, de 14,53% para uma empresa locadora enquadrada no lucro presumido e zero se a propriedade for de um FII.
A proposta de Franco é que o modelo vigente de isenções seja substituído pela tributação geral do imposto sobre a renda à pessoa física - que precisa ser atualizado para se tornar mais progressivo tal como em países da OCDE, ele ressalva.
Ao mesmo tempo, alíquotas incentivadas poderiam ser oferecidas para investidores com cotas em FIIs que gerem “externalidades positivas para a cidade e a sociedade”, diz Franco. “Poderia haver isenção se ele vai construir imóveis habitacionais com interesse social em área central ou se é um imóvel para uso comercial que cria emprego em áreas com pouca oferta de trabalho.” Essa seria uma forma de aproximar a reforma tributária, muito debatida, e uma reforma urbana. “É a possibilidade de pensarmos em sistemas integrados mais isonômicos.”