(Exame – Economia – 02/02/2021)
Luis Fernando Guggenberger e Angélica Rotondaro
Ao contrário do que poderia se esperar, houve um crescimento no mercado da indústria da construção de 8,30% durante a pandemia, segundo o Índice Nacional da Construção Civil (SINAPI), encabeçado pelo mercado ‘formiga’ para obras de adequação e pelo novo papel das moradias durante este período.
O setor da construção civil representa 7% do PIB brasileiro e, além de ser um termômetro do crescimento econômico e geração de emprego, também é responsável pelo uso de recursos finitos, emissão de gases de efeito estufa e impacto no consumo de energia e de recursos hídricos. Em termos de resíduos da operação e das embalagens, estima-se que o segmento seja responsável por 54% dos resíduos globais.
A boa notícia é que há um movimento em busca de repensar a circularidade dessa indústria liderado por três grandes vertentes. A primeira abrange a onda do ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança), que são critérios cada vez mais requeridos pelos bancos e investidores para checar o compliance das empresas, sua reputação na gestão do E-S-G e, com isso, mitigar potenciais riscos de crédito e de imagem. Um exemplo nesta lógica é proveniente do BNDES, que está em processo de estruturação de linha de crédito para empresas da indústria da construção que comprovem boa gestão de ESG.
A segunda vertente é relacionada à economia circular sob o prisma da inovação, por meio da identificação e incubação de negócios que apoiem gaps dentro da cadeia. Neste sentido, um exemplo vem da Vedacit. Desde 2018, a empresa já investiu R$ 4 milhões e acelerou 10 negócios, entre eles a startup NETResíduos, cuja solução contribui para a gestão de resíduos em canteiros de obras, e a Construcode, para digitalizar plantas de projetos e eliminar a necessidade de impressão destes documentos.
Em se tratando de uma economia circular na indústria da construção, é impossível não mencionar a urgência em se repensar a matriz da embalagem plástica, dado até mesmo o apagão de matérias-primas para produtos e embalagens durante a pandemia, bem como a necessidade de gerar menos problemas para a gestão de resíduos das construtoras. Outro ponto interessante são as cadeias complementares dentro do segmento da construção. Como exemplo, destacamos o Prolata, Programa de Logística Reversa para Latas de Aço, realizado pela Abeaço e Abrafati, em parceria com as empresas do segmento de tintas no país. O aço produzido por essa iniciativa posteriormente é adquirido pela Gerdau.
Por fim, a terceira vertente relaciona-se com um usuário final consciente dos produtos e seus usos, de modo a minimizar o impacto ambiental e possíveis danos para a saúde.
Acreditamos que há muitas oportunidades para a construção civil surfar a onda ESG e tornar-se um caso bem-sucedido e referência global. O caminho para isso passa por colocar a sustentabilidade como lente para alavancar inovação, seja no sistema construtivo ou na cadeia de fornecimento, e, com isso, ampliar a possibilidade de perenidade dos negócios. Basta abrir os olhos para esta agenda discutida em todo o mundo.