(Valor Econômico – Economia – 03/02/2021)
Álvaro Campos e Fernanda Bompan
O ano de 2020 foi difícil para os bancos, com a pandemia de coronavírus os obrigando a separar dezenas de bilhões de reais em provisões e levando ao que pode se confirmar como a maior queda no lucro em 20 anos. Para 2021, a expectativa é de recuperação, até em função da base de comparação baixa, mas o resultado do Itaú no quarto trimestre e seu “guidance” para este ano não trouxeram bons auspícios. E desta vez o foco é outro aspecto: as receitas de tarifas, que estão começando a ser mais afetadas pela competição com as fintechs e o Pix.
As receitas de prestação de serviço do Itaú tiveram queda anual de 4,8% no quarto trimestre, a
R$ 9,855 bilhões, e o banco informou que em 2021 devem crescer entre 2,5% e 6,5%, considerando os resultados de seguros. “Este ano teremos crescimento de receita de serviços em linha com recuperação da economia”, comentou o novo presidente do banco, Milton Maluhy Filho.
Ele afirmou que o Pix já teve impacto nas receitas de tarifas no quarto trimestre e que deve continuar afetando os resultados em 2021. Já sobre as fintechs, disse que uma maior competição é benéfica, mas deixou claro que todos precisam seguir as mesmas regras, e deu um recado para o Banco Central. “Nossa maior preocupação é com a concorrência, que se tenha o mesmo nível de regulação e se possa competir em condições de igualdade. O BC tem ciência disso, mas é sempre bom ressaltar”.
Ele afirmou ainda que o foco do banco será um modelo de negócio que se adapte à necessidade do consumidor. “Revisitamos sempre o modelo de negócios para garantir que não estamos reféns do passado”, comentou. “Não estamos cegos. Sabemos que a concorrência vai aumentar, nosso papel é estar preparados para reagir rapidamente”, acrescentou.
Os analistas do J.P. Morgan afirmam que a receita de tarifas do Itaú no quarto trimestre ficou aquém do esperado. “A queda nas receitas de tarifas da área de gestão de ativos (retração de 18,1% na comparação anual) já era mais ou menos esperada, já que a base de comparação era incomumente elevada. Mas as receitas de tarifas de conta corrente encolheram (queda de 5,2% na comparação anual) pela primeira vez na história”, dizem os analistas do banco americano.
Eles apontam que já há algum tempo estão preocupados com as receitas de tarifas de conta corrente, dada a maior competição nesse segmento, e que veem obstáculos para o setor bancário como um todo. “São os sinais iniciais que a competição com as fintechs está tendo nas receitas de tarifas”.
Já o Citi aponta que a receita de tarifas em geral só não foi pior em função da área de cartões, onde a queda desacelerou para 7,7% na comparação anual, se beneficiando da retomada na atividade econômica. Os analistas do Bradesco BBI, por sua vez, notam que sem a XP, a receita de tarifas do Itaú este ano deve crescer de 1% a 3%, “no melhor dos casos”.
Maluhy explicou que o guidance já não considera o resultado de equivalência patrimonial da XP a partir de fevereiro. Ele lembrou que em 31 de janeiro uma AGE aprovou a segregação da participação do Itaú na XP, criando uma nova companhia, a XPart, que deverá ser listada na B3. Maluhy afirmou que o Itaú deve entrar em breve com o pedido no BC para adquirir uma fatia adicional de 11,38% na XP, a ser concretizada em 2022.
A receita de tarifas também depende fortemente da economia. O Itaú tem uma projeção de que o PIB brasileiro crescerá 4% este ano, mas o presidente do banco disse que isso pode cair pela metade se houver um atraso de, por exemplo, seis meses na campanha de vacinação contra o coronavírus. “O cenário continua com razoável grau de incerteza, em especial no que diz respeito à crise sanitária”.
Maluhy destacou por diversas vezes que sua gestão terá a agenda de transformação tecnológica como uma prioridade. Aos 44 anos, ele assumiu o comando do Itaú nesta terça-feira, substituindo Candido Bracher, que atingiu o limite de 62 anos previsto no estatuto do banco e agora vai para o conselho de administração. Bracher afirmou que os investimentos em tecnologia devem continuar crescendo. “Em 2021 devemos investir 112% mais em tecnologia do que em 2018”.
Pelo menos em termos de inadimplência, as perspectivas parecem melhores do se esperava pouco tempo atrás. Se antes se previa um pico nos calotes no primeiro ou segundo trimestre, agora o Itaú diz que isso deve ficar para o quarto trimestre ou mesmo início de 2022, sendo que a inadimplência voltaria para os níveis pré-pandemia, ficando longe das máximas atingidas em crises anteriores. Perguntando pelos analistas se poderia haver uma reversão de provisões para devedores duvidosos (PDD) este ano, ele disse que sim. “Nós trabalhamos com o modelo de perdas esperados e isso antecipou as provisões”, disse.