Enquanto a Caixa Econômica Federal corre contra o tempo para se adequar às regras internacionais do setor financeiro, definidas no documento Basileia III, derivado do acordo da Basileia, as empresas ligadas diretamente ou indiretamente à construção civil observam com muita atenção se o banco terá condições de destravar o setor com nova liberação de recursos.
Atualmente, 78% dos financiamentos imobiliários saem dos cofres do banco estatal. Quando algo não vai bem na Caixa, os reflexos se espalham por construtoras, incorporadoras, fabricantes e lojas de materiais de construção, mercado de trabalho e, é claro, afetam a vida de quem espera pela chance de ter um imóvel.
Para o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, o clima é de apreensão. “Imagine se 70% do atendimento de saúde em Brasília fosse feito pelos hospitais públicos e eles simplesmente deixassem de atender? É mais ou menos o que ocorre com a Caixa, que tem papel tão relevante no setor da construção”, explica.
Segundo Martins, a previsão é de que, em 2017, o Produto Interno Bruto (PIB) da construção tenha encolhido 6%. “Normalmente o setor é responsável por puxar o PIB do país para cima, mas dessa vez devemos puxar em pelo menos 0,5% para baixo”, lamenta o empresário.
O principal problema da Caixa é não saber como a instituição vai se capitalizar para cumprir novas exigências internacionais de solidez financeira e atender padrões regulatórios mínimos quando o documento Basileia III entrar em vigor, em 2019. Isso causou uma espécie de letargia na instituição financeira, o que atingiu diretamente o setor imobiliário, que depende muito do banco para financiar seus clientes.
A solução poderia vir do uso dos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), mas o plano do Palácio do Planalto foi barrado. Em novembro passado, o Ministério Público fez uma representação junto ao Tribunal de Contas da União sobre possíveis irregularidades em operação entre a Caixa e o FGTS. No documento, foi questionado o plano do governo de injetar dinheiro do fundo no banco estatal.
Apesar do movimento do TCU, o Planalto seguiu com o seu plano e o sinal verde para que o dinheiro do FGTS fosse usado para capitalizar a Caixa foi dado no último dia 4, quando o presidente da República, Michel Temer, sancionou lei que permite a capitalização de até R$ 15 bilhões na Caixa com recursos do fundo.
Pela lei que o Senado e a Câmara dos Deputados aprovaram, fica autorizado que o Conselho Curador do FGTS compre instrumentos híbridos de capital e dívida da Caixa. Por meio de nota, o TCU informou que o processo de questionamento dessa manobra está em tramitação, portanto “não houve apreciação definitiva da matéria”. A Caixa foi procurada pela reportagem, mas não retornou os contatos.
Paralelamente à possibilidade de usar o FGTS, o banco estatal colocou em prática, no ano passado, algumas medidas para enxugar sua operação, como o programa de demissão voluntária (o PDV, que alcançou metade do número previsto de 10 mil desligamentos) e a desaceleração na concessão de crédito, que começou a ser percebida em 2015.
Em 2014, a Caixa liberou R$ 128,83 bilhões em crédito imobiliário, enquanto que em 2016 (dados de 2017 ainda não foram divulgados) a soma foi de R$ 83,46 bilhões. O número de contratos de financiamento imobiliário também apresentou queda expressiva. Enquanto em 2014 foram 1.405.923 contratos, em 2016 esse universo chegou a apenas 620.823.
Minha Casa Minha Vida - No programa habitacional Minha Casa Minha Vida (MCMV), o governo acena com a possibilidade de retomada. Segundo declaração recente do ministro das Cidades, Alexandre Baldy (PP-GO), a expectativa é de entregar cerca de 75 mil unidades no primeiro trimestre de 2018. O orçamento da pasta para o MCMV, neste ano, é de R$ 70 bilhões. O ministro disse acreditar que o número de unidades entregues será maior do que no ano passado. Na ocasião, ele admitiu que o governo deixou de investir em torno de R$ 24 bilhões no programa devido aos problemas de capitalização da Caixa.