Após dois anos com mais saída de recursos do que entrada, a captação líquida da poupança voltou a crescer em 2017 e deve continuar em trajetória positiva neste ano, segundo especialistas, apesar dos saques dos primeiros dois meses. O resultado reflete a recuperação da economia, que, com mais trabalhadores empregados e inflação baixa, permitiu que o brasileiro chegasse ao fim do mês com "sobra" de recursos.
Segundo dados do Banco Central, a captação líquida da poupança - excluindo a caderneta rural - foi de R$ 14,7 bilhões no ano passado. Em 2015, a poupança havia fechado o ano com resgates de R$ 50,1 bilhões e, em 2016, de R$ 31,2 bilhões.
Nos primeiros dois meses, o fluxo de aplicação voltou a ficar negativo, mas o movimento é considerado comum em início de ano, quando chegam contas como IPVA, IPTU e matrículas escolares, dizem especialistas. Os volumes, no entanto, foram menores do que nos anos anteriores, o que indica uma tendência de recuperação. Em janeiro, por exemplo, os saques foram de R$ 4,9 bilhões, enquanto no mesmo mês de 2016 e 2017 somaram R$ 9,5 bilhões e R$ 8,7 bilhões, respectivamente.
Em fevereiro deste ano, também houve mais retiradas que depósitos, deixando o saldo de aplicações negativo em R$ 586,2 milhões. Comparado com 2017, houve aumento das saídas, mas os depósitos cresceram. Em relação a 2015 e 2016 - quando os resgates líquidos no mesmo mês alcançaram R$ 4,8 bilhões e R$ 6,7 bilhões, respectivamente - houve uma melhora considerável.
Segundo especialistas, a tendência deve se reverter nos próximos meses. "O trabalhador recebe o 13º salário, aplica momentaneamente na poupança e, em janeiro e fevereiro, quando tem várias contas de início do ano, ele tira. Esses meses geralmente têm um saque maior", diz Celson Plácido, estrategista-chefe da XP Investimentos.
Ainda segundo Plácido, a recuperação da poupança é diretamente ligada à retomada da economia. "As pessoas estão tendo mais renda disponível. Em 2015, tínhamos uma inflação de 10%. Em 2016, caiu para 6%. Já em 2017, o índice era de 2,9%. Então, sobra mais renda, e o que as pessoas conhecem é a poupança", afirma. Ele explica que a disponibilidade do recurso, que pode ser transferido para a conta corrente a qualquer momento, faz com que as pessoas optem pela caderneta.
Deixar o dinheiro na poupança, contudo, não tem propriamente caráter de investimento. Isso porque as quantias aplicadas geralmente são as sobras do fim do mês, mas estão disponíveis para emergências. Esse comportamento explica a retirada no começo do ano. "Ela vai para a poupança mais pela comodidade, pelo fato de que está sobrando uma quantia. Quando ele precisar, ele tira o dinheiro dali", diz Plácido.
Apesar da queda sazonal no começo do ano, a tendência para 2018 é que a poupança continue atraindo mais recursos à medida que a inflação se mantenha controlada e os indicadores econômicos apontem recuperação. Analistas destacam, contudo, que outros produtos financeiros devem ganhar destaque, já que os investidores mais experientes seguem em busca de aplicações com rentabilidade maior.
"A poupança deve crescer devido à recuperação. Mas os outros [investimentos] tendem a crescer mais. Algumas pessoas vão ver que a poupança rende pouco e vão buscar outros investimentos", afirma Plácido. "Já estamos vendo uma migração do perfil conservador para o moderado, e do moderado para o arrojado."
Rodrigo Ayub, gerente-executivo da unidade de captação e investimento do Banco do Brasil, conta que também percebeu um aumento da captação da poupança no ano passado. Ele afirma que, embora o investimento seja muito popular, existe um movimento para que as pessoas busquem mais assessoria sobre como investir.
Ele conta que os multimercados tiveram uma forte procura em 2017, o que evidencia essa tendência de diversificação. É o caso do fundo BB Multimercado Macro LP 200, com aporte inicial de R$ 200 e acessível para investidores com menos recursos - o público da poupança. O fundo tinha saldo de R$ 56 milhões em dezembro de 2016 e saltou para mais de R$ 1 bilhão em dezembro de 2017.
Para Gilberto Abreu, diretor de investimentos do Santander, o aumento das aplicações na poupança cresceu devido ao cenário de juros baixos que, se for mantido, continuará atraindo aplicadores neste ano. Ele afirma que, mesmo que a rentabilidade do investimento tenha caído depois que a taxa Selic foi cortada para menos de 8,5% - atualmente, está em 6,75% -, a poupança acaba se tornando mais vantajosa que determinados produtos, como é o caso dos fundos de investimento mais conservadores, com rentabilidade atrelada ao CDI.
"Em um fundo de investimentos que dá 100% do CDI, você paga taxa de administração e impostos. Então, dependendo de quanto isso custa, a poupança pode valer mais a pena", afirma. A regra atual prevê que, com taxa Selic acima de 8,5%, a poupança renda 0,5% ao mês mais a Taxa Referencial (TR), que é calculada pelo Banco Central. Nesse cálculo, o rendimento equivale a 6,17% mais a TR ao ano. Com o juro básico abaixo de 8,5%, que é o cenário atual, a rentabilidade anual da poupança é de 70% da Selic mais a TR, o que faz com que a poupança renda em torno de 4,5%.