Envolvida em mais uma disputa societária, a gestora de recursos GWI, do coreano Mu Hak You, conhecido pelo comportamento agressivo nas empresas em que participa, conseguiu nesta terça-feira, 25, destituir o conselho de administração da construtora Gafisa, que já foi uma das líderes do setor no País e hoje enfrenta dificuldades. Na terça, a gestora, que detém de 37% das ações, conseguiu eleger um novo conselho da construtora. Dos sete novos membros, cinco foram indicados pela GWI (incluindo o próprio Mu Hak You), enquanto a atual administração ficou com apenas dois nomes.
A GWI é vista no mercado como uma espécie de investidor ativista – aquele que compra grande quantidade de ações em Bolsa com o objetivo de influenciar a administração. Companhias como Marfrig, Saraiva e Lojas Americanas já tiveram o empresário como sócio. A chegada de Mu Hak You geralmente inicia um período turbulento, que envolve troca de acusações, processos judiciais e problemas das companhias com órgãos reguladores.
Para Herbert Steinberg, presidente da consultoria Mesa Corporate, a postura da GWI é “agressiva, de ruptura”. “Na melhor das hipóteses, ele entra para fazer um turnaround(recuperação do negócio) e, na pior, o milking, ou seja, extração de recursos da companhia”, disse o especialista. “Não há preocupação em criar valor no longo prazo, e sim em sua própria estratégia de curto prazo.” Agora, porém, o dono da GWI promete “foco no acionista” (leia abaixo).
A agressividade, disse uma fonte que já lidou com o investidor coreano, não se limita ao apetite para comprar ações em Bolsa. Em reuniões em que ele está presente não raramente o interlocutor é interrompido com gritos e socos contra a mesa, contou um executivo ao Estado. Estratégias questionáveis também valem: em 2016, Mu Hak You foi filmado entrando nos escritórios dos diretores da Saraiva no fim de semana, mexendo em papéis de diretores da companhia.
O investidor teve a autorização para administrar carteiras suspensa pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por causa de operações envolvendo ações da Marfrig, em 2011, em valores acima do permitido pela legislação. A condenação, de 2017, foi confirmada na semana passada pelo órgão regulador.
A assembleia teve duração de quase cinco horas. A reunião estava agendada para começar às 10h30 na sede da Gafisa, mas teve início com quase duas horas de atraso, em meio a um clima tenso. Para a presidência da mesa foi eleito o advogado André de Almeida, do escritório Almeida Advogados, que representa a GWI. O agora ex-presidente do conselho de administração da Gafisa, Odair Senra, foi impedido de se candidatar para conduzir a assembleia por uma liminar obtida pela GWI.
Procurada, a Gafisa não quis comentar a reunião de terça-feira.
GWI promete transparência - A Gafisa passará por uma revisão em sua governança corporativa e em seu planejamento estratégico após a reconfiguração no conselho de administração definida na assembleia geral realizada na terça-feira.
Em breve conversa com o Estadão/Broadcast, o dono da GWI, Mu Hak You, afirmou: “Vamos ter foco nos acionistas e mais transparência na gestão.”
Executiva da GWI, Ana Maria Loureiro Recart evitou dar detalhes sobre eventuais mudanças pretendidas no dia a dia da companhia, mas disse que haverá “foco total nos resultados”. Ela acrescentou que, em breve, será convocada uma reunião do conselho eleito para alinhar as novas diretrizes da Gafisa.
Embora a GWI não confirme, fontes próximas do assunto disseram que as mudanças consideradas para a Gafisa envolvem possível troca na diretoria, revisão na política de remuneração dos principais executivos e mudança de sede, para redução de despesas administrativas.
Oposição - Efetivada na terça-feira, a troca do conselho de administração da Gafisa enfrentou oposição interna. As consultorias de governança corporativa Glass Lewis e Institucional Shareholder Services (ISS), que assessoram investidores em tomadas de decisões, recomendaram aos acionistas que votem contra a proposta de destituição do conselho. As consultorias argumentaram que a GWI não apresentou razões para substituição do grupo. A própria direção da Gafisa publicou recentemente um informe publicitário nos jornais criticando a iniciativa da GWI.
Relembre - Inaugurada em 1962, no Rio de Janeiro como Gomes Almeida Fernandes – GAF, a Gafisa assumiu o atual nome em 1997. Na década seguinte, teve a gestora GP e a Equity International, de Sam Zell, como sócias. Abriu o capital em 2006, adquirindo em seguida a Alphaville S/A (da qual ainda detém 30%) e a Tenda (alvo de spin off, ou separação de ativos, em 2017). Em dificuldades há pelo menos anos, a Gafisa pôs o pé no freio em lançamentos e hoje foca na redução de seu pesado endividamento. No segundo semestre, teve prejuízo de R$ 29,4 milhões, queda de 83% sobre igual período de 2017.