A Caixa Econômica Federal vai anunciar ainda em abril redução dos juros no crédito imobiliário que utiliza recursos da caderneta de poupança. Apesar do movimento mais tardio em relação aos pares privados, o banco da habitação não promete a taxa mais baixa do mercado, de acordo com o novo presidente da instituição, Nelson Antônio de Souza. Na semana passada, ele havia afirmado que existe um grande espaço para a expansão do crédito habitacional no País.
No passado, o banco capitaneou, ao lado do Banco do Brasil o processo de corte dos juros no País. "Não podemos botar banca se não tivermos condição", afirmou o executivo, em entrevista exclusiva ao Broadcast, a primeira desde que assumiu o comando do banco estatal, há exatamente uma semana.
A redução dos juros já estava em estudo pelo banco ainda na gestão de Gilberto Occhi, que foi deslocado da presidência da Caixa para assumir o Ministério da Saúde. No entanto, a recente mudança anunciada pelo Banco Central no depósito compulsório contribuiu, conforme o novo presidente do banco, para que a instituição tomasse tal decisão, aproximando-se, assim, dos seus pares privados que já cortaram os juros no crédito imobiliário no ano passado a reboque da queda da taxa básica, a Selic.
Apesar de sua gestão à frente da Caixa ter um tempo "exíguo", considerando as eleições presidenciais em outubro próximo, Souza reafirma que seu foco é o setor de habitação, da qual o banco é líder, e também atuar junto a segmentos que gerem mais emprego e renda, sem deixar de lado questões como capital e resultado financeiro.
Ele cita ainda, várias vezes ao longo da entrevista, concedida durante a sua participação no evento Summit Imobiliário Brasil 2015, promovido pelo Grupo Estado e que acontece hoje, em São Paulo, que o banco vai trabalhar como um "aliado" e "alinhado" ao seu Conselho de Administração, reforçando sua governança corporativa, que foi recentemente remodelada após o envolvimento de executivos do banco em casos de corrupção.
Com 39 anos de Caixa, Souza passou pela diretoria de Pessoas, Gabinete da Presidência, cuidou da Superintendência da Região Nordeste e do FGTS do banco público. Depois de ficar por dois anos na presidência do Banco do Nordeste, assumiu a vice-presidência de Habitação da Caixa, em 2016 até o início desse mês, quando foi escolhido para dar continuidade à gestão de Occhi. Leia abaixo, os principais trechos da entrevista:
O senhor tem menos de um ano de gestão no comando da Caixa, considerando que o Governo mude nas próximas eleições. O que dá tempo de fazer? - Primeiro, é dar continuidade ao trabalho que o (Gilberto) Occhi vinha fazendo e que permitiu um lucro considerável ao banco no ano passado, de R$ 12,5 bilhões (no critério ajustado). Mas eu diria que trabalhar em áreas que tenham um balanço social forte, que é o caso da habitação. Vejo também que as PPPs (parcerias público privadas) são outra saída que podemos chegar, mas não sei se teríamos um resultado já em 2018. E sempre colocando esses produtos para setores que gerem emprego e renda. Esse é o foco. Mas em harmonia com o Conselho de Administração sob o ponto de vista de utilizar uma política de governo sem, contudo, abrir mão da governança e da consistência de resultados econômicos e financeiros da Caixa.
É possível superar o resultado de 2017, que já foi recorde? - Não dá para superar por conta da queda da taxa de juros porque o spread (diferença de quanto um banco paga para captar e o quanto cobra para emprestar) diminuiu. Mas podemos repetir o lucro recorrente de 2017, que foi de R$ 8,4 bilhões, que, assim como o ajustado, foi o maior da nossa história. Nosso desafio é, mesmo com a redução da taxa de juros e do spread, é manter o recorrente.
Como pretende fazer isso? - Com crédito consistente e trabalhar muito na redução da inadimplência. Nosso índice já é o menor (do mercado), mas temos de lutar muito para baixá-la. É uma prioridade da Caixa. Vamos procurar aplicar recursos seja na carteira comercial ou na de habitação considerando o fator de ponderação de risco para podermos potencializar o nosso capital, ou seja, aplicar mais com menos capital e trabalhar as receitas de prestação de serviços sem, contudo, abrir mão da melhoria de processos, a eficiência.
E a redução de juros nas linhas de crédito imobiliário que usam recursos da caderneta de poupança vem quando? - Estamos precificando. Ainda não concluímos. O mais breve vamos anunciar. Essa semana já não dá mais, mas ainda em abril nós queremos divulgar a nova taxa de juros da Caixa no crédito imobiliário.
A Caixa vai voltar a ter a taxa mais atrativa do mercado? - Eu diria que a Caixa vai ter taxas compatíveis ao mercado. Eu não gosto muito de dizer que é menor. Nós só podemos botar banca se tivermos condições.
A mudança nos depósitos compulsórios ajuda o movimento de redução dos juros no crédito imobiliário? - Vai dar um fôlego para nós. A mudança no compulsório melhorou a nossa tomada de divisão, mas já vínhamos estudando.
O direcionamento da Caixa muda com a troca de presidente? - Nesse aspecto, não. Vamos trabalhar em perfeita harmonia com o nosso controlador, o Ministério da Fazenda e o Conselho de Administração da Caixa.
Em termos de capital, a mudança no depósito compulsório traz algum alívio para a Caixa? - Não influencia em capital, mas coloca recursos no orçamento. Do lado do capital, sabemos que a partir de janeiro temos outra exigência de Basileia III, com o capital de nível 1 indo para 9,5%. No nosso plano de capital de 2017, fizemos um bom dever de casa com a decisão da equipe econômica, com o nosso Conselho de Administração e o Governo Federal de manter os dividendos de 2017 na Caixa. Teremos um fôlego. Vamos trabalhar olhando sempre qual o passo que podemos dar em termos de capital.
Quais passos para reforçar o seu capital que a Caixa está olhando neste momento? - Temos um plano de aplicar os recursos de 2017 e acompanhar como a economia vai andar, lançamentos em habitação e outros programas. Estamos trabalhando apenas com o lucro que tivemos.
Com a piora das condições externas, uma emissão de dívida no mercado internacional foi descartada? - Está em estudo, mas nós não decidimos por fazer uma emissão externa ainda. O preço é alto. Temos de analisar com calma se realmente vale a pena. Vai depender muito da exigência da própria economia.
E o que o 'banco da habitação' espera para este setor em 2018? - Temos uma meta de 650 mil unidades de habitação neste ano e estamos avaliando o que podemos fazer até para aumentá-la sem perder de vista o capital. Teremos de fazer escolhas dentro da ponderação de risco. Nosso foco é habitação.
Mas a concorrência está avançando na fatia da Caixa, aproveitando-se da questão do capital. É possível recuperar mercado? - Os bancos privados estão mais agressivos porque têm uma disponibilidade maior de recursos e mais confortáveis em termos de capital. Então, eles têm um poder maior que o da Caixa. Agora, a Caixa ainda tem a maior participação de mercado mesmo nas linhas de SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo) e está estudando como pode trabalhar em cima disso. E, em 2018, acho que já poderemos começar a trabalhar as letras imobiliárias garantidas (LIGs, similares aos covered bonds na Europa) que reforçam o crédito para habitação.
E o plano estratégico da Caixa? Alguma mudança de rota na sua gestão? - Estamos trabalhando sábado, domingo, de manhã, de tarde e de noite para apresentar nosso planejamento estratégico na próxima semana. Não fechamos o plano ainda. Mas vamos trazer temas novos. O prazo (de sua gestão) é exíguo. Tem de correr.
Está prevista alguma troca na vice-presidência da Caixa? - Ainda não conversei sobre esse assunto com a presidente do Conselho de Administração do banco (Ana Paula Vescovi). Todo o processo de escolha de executivos é uma competência do Conselho que eu ainda tenho de conversar com a Ana Paula. Se nós acharmos que tem de mudar alguma coisa assim faremos, cumprindo fielmente o novo regramento do banco. O diretor de Habitação, Paulo Nunes, que está como interino na vice-presidência de Habitação, antes ocupada por mim, também vai passar pelo processo de apuração. Vamos trabalhar em perfeita harmonia com o Conselho de Administração. Não vejo como a diretoria executiva trabalhar sem ser aliada e alinhada ao Colegiado.