(Valor Econômico – Finanças – 15/02/2019)
Talita Moreira e Flávia Furlan
Os grandes bancos privados assumiram a dianteira no processo de recuperação do crédito - papel que será reforçado neste ano, a julgar pelas estimativas das próprias instituições financeiras. Itaú Unibanco, Bradesco, Santander e Banco do Brasil fecharam 2018 com um estoque de empréstimos e financiamentos de R$ 2,253 trilhões, alta de 5,97% em um ano. O crescimento teria sido de 7,94% se excluído o BB dessa conta.
A disparidade confirma o protagonismo que os bancos privados terão na nova etapa do crédito, numa inversão frente ao que se viu há uma década. No governo Dilma Rousseff, BB e Caixa foram usados para financiar um crescimento econômico baseado no consumo, o que penalizou a rentabilidade e o capital dessas instituições.
Para ajustar as contas com o passado, os bancos públicos já vinham perdendo espaço no crédito desde o início do governo Michel Temer, mas num mercado que estava todo em queda. A participação dos estatais no estoque total de crédito, medido pelo Banco Central, foi de 55,8% em 2015 para 51% em dezembro. Com as carteiras das instituições privadas voltando a crescer mais fortemente no último trimestre de 2018, a tendência é que essa fatia se reduza ainda mais. Os planos do governo de Jair Bolsonaro de reduzir as operações com recursos direcionados também devem contribuir para isso.
"Estamos no ciclo de recuperação, agora vamos entrar num ciclo de crescimento", afirmou o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Jr., após a divulgação dos resultados no fim de janeiro. O tom contrasta com o adotado ontem pelo presidente do BB, Rubem Novaes. "Você pode levar um cavalo ao bebedouro, mas ele só bebe se quiser. Para o crédito, a mesma situação se apresenta", disse em entrevista a jornalistas.
A explicação do BB para um crescimento mais tímido do crédito, frente aos pares privados, está no saneamento da carteira. O vice-presidente de negócios de varejo do BB, Marcelo Labuto, disse ontem que algumas linhas - como as de micro e pequenas empresas - passam por esse processo de "limpeza". "Tenho de desembolsar o suficiente para cobrir as operações que estão saindo e ainda crescer", disse.
Para o executivo, bancos públicos e privados não partem do mesmo ponto. "O BB nunca deixou de atender as necessidades do mercado, enquanto os concorrentes ora saem, ora retornam, o que faz com que as bases de largada sejam diferentes."
Se o desempenho do BB foi mais fraco no crédito, por outro lado ajudou a engordar os resultados do setor. Os quatro grandes bancos de capital aberto lucraram juntos R$ 73,2 bilhões no ano passado, em termos ajustados. A cifra representa alta de 12,77% em relação a 2017. Sem o Banco do Brasil na conta, o aumento teria sido de 10,84%.
O BB lucrou R$ 13,513 bilhões no ano passado, alta de 22,2%. A estimativa do banco é entregar um resultado entre R$ 14,5 bilhões e R$ 17,5 bilhões em 2019. "Os números resultam da boa administração que me antecedeu, marcada por contração de despesas, progressivo saneamento da carteira de crédito e correta política de alocação e gestão de capital", disse Novaes.
O BB tinha R$ 697,3 bilhões em operações de empréstimos e financiamentos no fim de 2018, alta de 1,8% em relação a 2017. Para este ano, a instituição projeta crescimento de 3% a 6%.
Ainda assim, a estimativa é bem inferior à apontada pelos concorrentes. O mais animado do quarteto é o Bradesco, que vem demonstrando bastante otimismo com as perspectivas para a economia e espera crescer entre 9% e 13% no crédito neste ano.
O Itaú prevê alta de 8% a 11% em seu portfólio de empréstimos e financiamentos. "O banco está com planos vigorosos de crescimento na carteira de crédito", disse o presidente do Itaú, Candido Bracher. Isso inclui, segundo ele, uma disposição maior para oferecer linhas de riscos mais elevados. Já o Santander não divulga estimativas, mas vem avançando em ritmo superior ao dos pares. "Ainda vemos espaço para continuar crescendo com rentabilidade neste ano", disse o presidente do Santander, Sergio Rial, na divulgação de resultados.
Até agora, a retomada do crédito está concentrada nos segmentos de pessoas físicas e de micro, pequenas e médias empresas. A demanda das grandes companhias ainda é fraca, e parte dela tem sido suprida pelo mercado de capitais.
A expectativa dos bancos, porém, é que haja maior procura das grandes empresas por crédito com a aprovação da reforma da Previdência, cenário que deve levá-las a desengavetar planos de investimentos. "Nas grandes empresas, a demanda já tem melhorado um pouco e poderá melhorar ainda mais quando for aprovada a reforma da Previdência", destacou Bracher.
No BB, segundo Novaes, as estimativas "modestas" para o crédito poderão ser revisadas caso haja a aprovação de uma reforma da Previdência "muito boa" - o que, para o executivo, hoje é apenas uma "esperança matemática".