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Uma solução criativa para o FCVS

27/05/2019 / Categorias Mercado imobiliário , Economia

(Valor Econômico – Opinião – 27/05/2019)

Jairo Saddi

O Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS) foi criado pela Resolução 25, de 16/6/1967, do Conselho de Administração do extinto Banco Nacional da Habitação (BNH) com três objetivos principais: garantir o equilíbrio da apólice do seguro habitacional do Sistema Financeiro da Habitação (SH/SFH), inclusive em liquidações antecipadas; garantir o limite do prazo para amortização; e, principalmente, cobrir o saldo devedor, parcial ou total, dos financiamentos, em caso de morte ou invalidez permanente do mutuário, assim como as despesas de recuperação ou de indenização decorrentes de danos físicos ao imóvel e as perdas de responsabilidade civil do construtor. Tivéssemos nos mantido nestes restritos propósitos, o governo federal não teria atualmente um esqueleto deste tamanho...

Com o advento da aceleração da inflação nos anos 1980, o FCVS se tornou literalmente um subsídio aos mutuários de imóveis, já que as prestações previstas naqueles contratos habitacionais não sofriam correção monetária de acordo com os índices oficiais à época, restando ao FCVS a diferença a ser paga, sem qualquer previsão orçamentária, ainda que fosse obrigação do Tesouro Nacional.

A dívida atualizada é de quase R$ 300 bilhões, sendo quase 55% em obrigações ainda não novadas, cujo vencimento é em final de 2026 (prorrogada originalmente pela Lei n. 8.004, 15/3/1990, que, ao conceder novos subsídios, determinou que o Fundo quitasse os saldos de sua responsabilidade no prazo de 10 anos, com 3 anos de carência). Como não foram pagas, a Lei nº 10.150, de 21/12/2000, autorizou a União a "novar tais dívidas, após a prévia compensação entre débitos originários de contribuições devidas pelos agentes financeiros ao Fundo e créditos decorrentes dos resíduos apurados dos contratos, condicionado, ainda, ao pagamento das demais dívidas no âmbito do SFH (....) efetuado no prazo de 30 anos, contados a partir de 1/1/1997 - sendo oito anos de carência para o pagamento dos juros -, calculados a 6,17% ao ano (operações com recursos próprios) ou a 3,12% ao ano (operações lastreadas com recursos do FGTS) - e 12 anos para o pagamento do principal, mediante a formalização de contratos entre a União e os agentes financeiros".

Pois bem, por quais razões o assunto volta à tona? Raquel Balarin, neste Valor, de 30/4/19 (pág. A2), em "O velho esqueleto que ainda assombra bancos", levantou no tom preciso as dúvidas concernentes à liquidação das dívidas do Proer (no qual o FCVS é o ativo de alguns bancos liquidados e foi aceito pelo BC nas dívidas). Mas há muita incerteza quanto ao pagamento dos 3.375.825 contratos - e algum precedente quanto ao calote das obrigações ainda não homologadas. O processo, gerenciado pela CEF, é físico, tripartite e complexo, e até a emissão do título público, o CVS, que tem valor de mercado, o deságio pode chegar a 80%, sem falar que deve passar pela Controladoria Geral da União (CGU), antes de ser enviado ao Tesouro. A novação implica aceitar redução de encargos de juros.

Por um lado, há a lição de uma péssima política pública, tanto em razão do subdimensionamento das correções com as equiparações salariais, quanto também da lógica perversa do mau pagador, que nunca cumpre o que combina. Mas há mais. Trata-se de verdadeiro calvário a habilitação ao pagamento do saldo devedor dos contratos liquidados; com baixa transparência e sem qualquer prioridade. Entre maio de 2012 e agosto de 2015, após questionamentos levantados pela Secretaria Federal de Controle Interno da CGU, e depois em 2016, o processo se interrompeu e a novação se deu a conta-gotas (para cumprir obrigações de entes públicos com o Estado ou liquidados).

Talvez fosse mesmo melhor repensar a novação, já que o FCVS não vale o seu valor de face, e estruturar algum leilão reverso para que essa "moeda podre" sirva para o pagamento de certas obrigações não tributárias para com o Estado - e que tal quitação não se dê ao par, vale dizer, seja referenciada exclusivamente por seu valor de mercado.

Sempre se soube que o Estado não tem qualquer restrição financeira tanto na emissão da moeda quanto na contratação de obrigações - e securitização como foi o FCVS - e pode se endividar ao seu bel prazer. Mas a diferença aqui é quanto à sua credibilidade, a qualidade de crível, de crença. Um novo calote custa muito a um país de baixa qualidade de crédito (na forma de juros, de dívida pública....), e sem que se resolva o passado, torna-se ainda mais caro. Num tempo de ajuste fiscal, resolver o passado é sempre difícil, mas uma solução engenhosa pode contribuir para um grande e vantajoso acordo.

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