A expectativa de que a taxa básica de juros (Selic) recue para 7% ao ano até dezembro – e se mantenha neste patamar em 2018 – deverá aquecer o setor de fundos imobiliários e incentivar novos projetos.
Essa premissa faz sentido para especialistas consultados pelo DCI e tem um histórico que confirma esse ciclo de atração de investidores pessoas físicas do varejo alta renda para obter ganhos com essas carteiras.
Quando a Selic esteve numa faixa entre 7,25% e 8% ao ano, o segmento registrou recordes de captação primária, R$ 11,069 bilhões em 2012 (44 ofertas) e outros R$ 10,496 bilhões em 2013 (33 ofertas), o que foi considerado como um boom.
Em menor grau, o segmento de fundos imobiliários já mostra uma reação em 2017. O IFIX – índice com os 74 fundos mais líquidos – avançou 18,78% no ano até 27 de setembro, e 22,96% nos últimos 12 meses, segundo dados da B3.
Em termos de captação primária, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já registrou 18 ofertas até setembro com a entrada de R$ 3,648 bilhões em recursos, mais que dobrando o volume de R$ 1,791 bilhão em igual período do ano passado.
A xerife do mercado informa pelo menos mais seis ofertas em análise, que podem ser distribuídas nos próximos meses para corretoras, gestoras e bancos, num montante de R$ 2,037 bilhões em novos aportes.
“Apesar da similiaridade com o movimento da taxa de juros, posso dizer que atualmente vivemos um momento mais propício, os preços das cotas estão mais ajustados após a crise econômica [2015 e 2016], enquanto naquela época do primeiro mandato do governo Dilma Rousseff, os preços dos ativos imobiliários já estavam valorizados”, comparou o gerente de investimentos da Concórdia Corretora, Mauro Mattes.
O principal risco para a rentabilidade das carteiras com imóveis continua relacionado a alta nos juros. Na medida que a Selic sobe, os investidores migram seus recursos de ativos reais para a renda fixa, a economia desaquece e o preço de cotas dos fundos dessa categoria se desvalorizam e perdem liquidez.
No ciclo de alta dos juros iniciado no segundo mandato de Dilma Rousseff, o número de ofertas primárias caiu para 16 em 2014 (R$ 4,726 bilhões) e para a mínima de 10 ofertas em 2015 (R$ 5,757 bilhões). O agravamento da recessão em 2016 diminuiu ainda mais a captação para apenas R$ 2,1 bilhões.
“Com o aumento da Selic para 14,25% ao ano, os investidores migraram para renda fixa, e a crise econômica ainda fez aumentar o índice de vacância dos fundos de renda de aluguéis”, lembrou Mauro Mattes.
Para o superintendente financeiro do Banco Ourinvest, Alberto Alves, a baixa dos juros já está promovendo uma “primeira onda” de valorização dos fundos listados na B3. “Teve fundo que já recuperou 50% em relação às mínimas. Essa primeira onda ocorreu. Com juros caindo praticamente pela metade [de 14,25% para 7%] provavelmente teremos uma segunda onda, de avanço do setor imobiliário, com diminuição da vacância e o lançamento de fundos com lajes corporativas”, aponta o superintendente.
O executivo argumentou que a isenção do imposto de renda para pessoas físicas em fundos imobiliários torna a rentabilidade mais percebida pelos cotistas num cenário de juros baixos. “Esse benefício fiscal é sentido pelo investidor”, disse Alberto Alves.
Nos cálculos de Mattes, da Concórdia, as carteiras de renda com aluguéis proporcionam retorno líquido entre 0,60% e 0,70% ao mês. “Não tem tributação”, diz.
O setor reúne ainda outras alternativas além de carteiras com renda de aluguéis. “Há uma série diversa de fundos: hotéis, de agências bancárias, galpões logísticos, shoppings, de papéis com recebíveis imobiliários [CRIs] e de desenvolvimento de projetos [construção]“, conta Mauro Mattes, da Concórdia.
Já Alberto Alves, da Ouroinvest aponta no horizonte próximo, o surgimento de ofertas de fundos para o desenvolvimento de shoppings e centros de distribuição. “Com a retomada do consumo, os shoppings têm apelo”, diz.
Novidades no radar – Entre as tendências que estão sendo apontadas que podem aumentar expressivamente o volume do setor num cenário de juros básicos baixos por um período mais prolongado está a constituição e a distribuição de fundos com imóveis públicos.
O Estado de São Paulo, por exemplo, prepara um fundo imobiliário com 267 imóveis em 57 municípios, sendo 118 deles na região metropolitana.
De acordo com dados divulgados pela Companhia Paulista de Parcerias (CPP) da Secretaria da Fazenda, 241 imóveis foram avaliados em R$ 1 bilhão, sendo que 178 da região metropolitana, com valor médio de R$ 2,016 milhão cada somam aproximadamente R$ 358,9 milhões, e outros 63 imóveis no interior com áreas maiores exibiam valor médio de R$ 10,128 milhões, representando R$ 643,737 milhões na carteira inicial.
“O Estado não é uma imobiliária. Temos um problema de venda e no formato de venda. O fundo é como um condomínio fechado, terá um gestor que buscar a melhor forma de explorar o potencial comercial desses imóveis”, o representante da CPP, Bruno Correia Lopes.
Ele preferiu não adiantar quando as cotas da carteira com imóveis públicos serão distribuídas aos potenciais investidores, mas no mercado, dentro do tempo necessário para formalizar uma oferta, calcula-se que dentro de um ano essa operação possa ser concluída.
O exemplo estadual também pode ser replicado em grandes municípios. Em um fórum sobre infraestrutura realizado na semana passada, o prefeito de São Paulo, João Dória Júnior, também citou a possibilidade da constituição de um fundo com imóveis da cidade.
Entre os projetos que podem incentivar a criação de fundos ou a participação de investidores via fundos imobiliários está o relacionado às áreas de terminais rodoviários. “No Japão, não se vê os ônibus [nos terminais], se aproveita todo o espaço [na parte de cima] com empreendimentos”, contou o prefeito.
Como referência, ele citou o modelo do Shopping Santa Cruz, projeto comercial que foi desenvolvido com integração à Estação do Metrô Santa Cruz, na cidade de São Paulo.
No mesmo evento de infraestrutura, Isadora Chansky, responsável pela unidade de parceiras público-privadas (PPPs) do Estado de São Paulo, comentou que a tendência é que os governos priorizem projetos auto sustentáveis que não dependam de recursos públicos para manutenção. “O governo não tem a mesma expertise [experiência] que o setor privado”, afirmou Isadora Chansky.
Na visão dela, há uma série de empreendimentos públicos que podem ser explorados comercialmente. “Fundos e a iniciativa privada podem apresentar estudos de viabilidade econômica com regras de compartilhamento de receitas”, diz.
Ofertas previstas – Entre as ofertas em análise na CVM, o prospecto do Malls Brasil, de R$ 575 milhões, pretende destinar a utilização dos recursos para: Maceió Shopping; Osasco Plaza; Granja Vianna, Via Brasil e Shopping Natal.