(Folha de S. Paulo – Colunas – 03/01/2019)
O mercado imobiliário urbano é altamente diversificado, com inúmeros produtos distribuídos espacialmente pelas cidades. É um setor que tem características próprias, principalmente no que diz respeito ao ciclo de produção, que é relativamente longo se comparado a outras atividades econômicas. Portanto, é uma indústria que aloca e acumula capital no espaço e no tempo.
Pesquisadores em economia urbana que estudam as bolhas imobiliárias, provocadas principalmente por distorções econômicas no mercado, apontam que seus efeitos vão desde a queda abrupta nos preços até os elevados riscos financeiros para os bancos e outros setores da economia. Além disso, ressaltam que efeitos como a vacância, a deterioração do estoque construído e a queda de preços afetam-se mutuamente, e podem prejudicar as áreas urbanas onde se situam.
As recentes crises do mercado imobiliário em países como Irlanda, Reino Unido e EUA revelam a estreita relação entre mercado imobiliário e mercado de capitais. A crise no mercado de hipotecas americano em 2007 e 2008 evoluiu, em pouco tempo, para uma crise financeira e econômica internacional. Isso foi possível porque o risco dos mercados imobiliários locais foi distribuído globalmente por meio de produtos e mecanismos financeiros inovadores (engenharia financeira e securitização), estabelecidos com controles insuficientes e responsabilidades de gestão pouco claras por parte de uma estrutura financeira sofisticada e bem conectada. Subsequentemente, esse risco circulante foi reforçado na forma de escassez internacional de capital no mercado interbancário, afetando novamente as economias locais.
Essa crise trouxe à tona a importância de um regramento mais claro nas operações que envolvem produtos imobiliários e o mercado de capitais. Contudo, expôs também a interdependência essencial que existe entre o mercado imobiliário e os mecanismos de financiamento.
Sob o ponto de vista dos mercados financeiros, a enorme quantidade de capital aplicada em investimentos imobiliários representava um problema fundamental. Os imóveis, financiados principalmente por empréstimos bancários, amarravam grandes somas de capital por longo prazo. As inovações no mercado financeiro acabaram por reestruturar os modelos de financiamento, nos quais o empreendedor necessitava de um fluxo de caixa estável para pagamento do empréstimo durante determinado período, e depois transferia o risco de inadimplência para os bancos.
Essa situação mudou por meio de inovações financeiras, como fundos imobiliários abertos e fechados. Esses fundos obtêm o capital necessário no mercado de capitais, por meio de investidores privados e institucionais. Desta forma, o risco do empréstimo passa do banco para o investidor privado, e o imobiliário é convertido em produtos de investimento financeiro negociáveis, com requisitos de rendimento claros, que, em princípio, podem ser liquidados a qualquer momento.
Atualmente, é imprescindível um amplo conhecimento dos ambientes financeiros globais e do mercado local. Esse conhecimento, no entanto, envolve numerosos aspectos, e é distribuído de forma desigual entre os atores do mercado. Os processos necessários de coleta de informações, de transformação dessas informações em conhecimento de mercado e da distribuição desse conhecimento são essenciais para que empreendedores, governo, bancos e agentes do mercado de capitais, responsáveis pela estruturação segura de modelos de financiamento, garantam um mercado imobiliário saudável dentro dessa nova geografia financeira.