(Valor Econômico – Finanças – 24/06/2019)
Naiara Bertão
Mais de R$ 56 bilhões. Este é o montante de dinheiro que está em fundos de renda fixa indexados ao CDI que são caros e pouco rentáveis. Levantamento feito pelo Valor Investe com base em dados da Morningstar mostra que há 53 fundos de varejo com taxas de administração acima de 2,5% ao ano, sendo que 49 deles não estão pagando nem o CDI a seus 1,6 milhão de cotistas. Essas 49 carteiras somam mais de R$ 56 bilhões em investimentos.
Da amostra, apenas quatro fundos com taxa de administração acima de 2,5% renderam mais do que o CDI, tanto no ano passado, quando o CDI rendeu 6,42%, quanto no acumulado deste ano até o fim de maio, de acordo com a Morningstar.
Com a taxa Selic em 6,5% ao ano, uma taxa de administração acima de 2,5% já tira quase 40% da rentabilidade. Uma taxa de 2% pega 31%. O estudo leva em conta apenas fundos com mais de 150 cotistas e exclui os destinados só a empresas. Considerando que as apostas de um novo corte na Selic ainda este ano aumentaram, o peso proporcional desses custos, reduzindo o rendimento final do cotista, só vai crescer.
A maioria dos fundos caros e com baixa rentabilidade é de gestoras de grandes bancos. Boa parte deles são fundos apelidados de "raspa contas" - aqueles que, sob consentimento do cliente, a instituição financeira tira o dinheiro parado na conta corrente e coloca em um fundo com resgate automático. Os "raspa contas" têm geralmente no nome palavras como "automático" ou "transferência voluntária" e são tipicamente fundos grandes, com muitos cotistas e patrimônio líquido alto.
Alguns desses fundos chegarem a cobrar taxa de 5% ao ano. Por serem de curtíssimo prazo, esses fundos pagam Imposto de Renda e estão sujeitos a Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que incide até o 30º dia de aplicação.
Uma evidência de que é possível concorrer com esses fundos é que há fintechs apostando em contas correntes atreladas a CDBs que rendem igual ou mais que 100% do CDI como uma forma de atrair clientes.
Outra questão importante é que essa estratégia evita deixar dinheiro no depósito compulsório. O Banco Central exige que, de todo o dinheiro que a instituição financeira tiver em depósitos à vista (conta corrente), deixe 25% depositados compulsoriamente no próprio BC (essa alíquota já foi de 40% no passado), sem remuneração, como um colchão de segurança para eventuais necessidade de saques. Já para o montante que está na poupança, o recolhimento obrigatório no BC é de 20% e o depósito é remunerado. Mas existe a obrigação de que outra parcela seja destinada a crédito imobiliário.
Embora os investimentos por esses fundos sejam bastante conservadores, vale dizer ainda que eles não têm a proteção do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que devolve o dinheiro que fica na poupança e na conta corrente.
Considerando que existem no mercado 2.470 fundos de renda fixa com R$ 2,12 trilhões sob gestão, a amostra de fundos caros e pouco rentáveis parece pequena, ainda mais porque só considera um tipo de fundo (referenciado DI). Entre os fundos DI com mais de 150 cotistas abertos antes de novembro de 2018, há ao menos 291 fundos. Desse total, apenas 27% tem uma taxa de administração igual ou maior a 2% ao ano, ainda considerada alta. Ou seja, 73% cobram menos. "Fundo DI com taxa de administração acima de 2% é exagerado. É difícil achar uma justificativa para explicar um custo tão elevado", explica o economista Marcelo d'Agosto, responsável pelo levantamento.
Considerando os 49 fundos do levantamento com taxa de administração igual ou acima de 2,5% e rendimento abaixo do CDI, os cotistas poderiam ter ganhado cerca de R$ 1,59 bilhão a mais em 2018 se a taxa de administração cobrada fosse de 1%.